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segunda-feira, 13 de julho de 2009

Alexandre Oliva afirma que o Linux não é livre!

Abaixo segue o texto de Alexandre Oliva, vale a pena ler...
;)

Linux-libre e o Dilema dos Prisioneiros

Apesar do dilema moral e dos riscos técnicos e jurídicos, diversas distribuições de GNU+Linux que valorizam a liberdade tendem a aceitar e distribuir o Software não-Livre integrado ao núcleo Linux, além de facilitar e encorajar seu uso. Por que decidem trair as liberdades de seus usuários e ajudar fabricantes de hardware a capturá-los?

Linux não é Software Livre

Quando foi lançado, em 1991, o núcleo Linux não era Software Livre. Tornou-se Livre no ano seguinte, através de relicenciamento, mas vem se tornando progressivamente não-Livre, ao aceitar "contribuições" de fabricantes de hardware que não têm interesse nem incentivo para respeitar seus consumidores.

Linux tem recebido Software não-Livre que roda em modo privilegiado (drivers) ou em dispositivos periféricos às CPUs principais (firmware), tendo acesso a todo o sistema: barramentos, memória, controladores de DMA e de interrupções, podendo assim causar toda sorte de interferência e problemas, desde acidentes como erros de travamento do sistema ou corrupção de informação, até problemas intencionais, como coleta e transmissão de informação do usuário.

Esses "contribuidores" ainda estabelecem armadilhas jurídicas. Alguns proíbem engenharia reversa, e fornecem documentação sob acordos de manter segredos (NDA). Alguns distribuem seus códigos, sob a GPL ou licenças compatíveis, mas sem fontes, induzindo à violação e portanto à revogação automática da licença do Linux.

Outros adotam licenças contraditórias: há um fabricante de cartões de rede que adicionou ao Linux um programa de 100Kb, na forma de código objeto, sob licença não-Livre e incompatível com a GPL (o que já é um problema), e depois adicionou outro driver, com mais 300Kb de código objeto não-Livre, que veda sua distribuição conjunta com software da mesma empresa que tenha sido disponibilizado sob licença diferente da GPL, como, por exemplo, o programa de 100Kb.

Não é irônico que Linux seja tomado por alguns como ícone maior do Software Livre, quando não o é? Por não ser Livre, todo mundo que distribui versões recentes do Linux está sujeito a ameaças jurídicas desses vilões, e, se já não perdeu, pode acabar perdendo o direito de distribuir, modificar e, no entendimento de alguns juristas brasileiros, até de executar o Linux!


Stux, bonitinho mas preso,
de Lewis Laë


Nasce o Linux-libre


Freedo, limpo e Livre, de
Burnaron e Rubén Rodríguez Pérez


Para tentar reverter essa tendência de poluição do Linux com Software não-Livre, e para propiciar a usuários e distribuições socialmente conscientes o núcleo Livre que necessitam, deu-se início ao projeto Linux-libre. Começou na distribuição gNewSense, passou a ser mantido pelo então mantenedor da distribuição BLAG, depois por mim, na FSFLA. Hoje é adotado por praticamente todas as demais distribuições com compromisso público de distribuir somente Software Livre: Musix GNU+Linux, Trisquel GNU/Linux e Dragora GNU/Linux, além de dyne:bolic e UTUTO XS que estão em processo de adoção.

Entre as distribuições mais populares, que até valorizam o respeito às liberdades dos usuários, mas não fazem disso um compromisso tão firme, a lógica que impera parece ser a do medo de perder usuários para as outras. Assim, quando uma adota um componente não-Livre, a fim de atrair uma determinada classe de usuários, as demais se vêem pressionadas para fazer o mesmo, sob o risco de perder potenciais colaboradores. Ao invés de perdê-los, perdem controle sobre o software que distribuem aos usuários, expondo a si mesmas e a seus usuários a riscos técnicos e jurídicos.

Curioso é que todos aqueles que possuem os dispositivos que precisariam daquele software para funcionar, sob controle do fabricante, já receberam uma cópia juntamente com o dispositivo, e poderiam facilmente obter outra diretamente do fabricante. Será que faz sentido esse comportamento das distribuições, de se poluírem e sujarem as mãos para ajudar a levar esse software a quem já o recebeu e já decidiu entre rejeitar esse software ou ceder ao fabricante o controle do computador?

Analisando o jogo

O dilema dos prisioneiros é uma observação curiosa da ciência econômico-matemática denominada Teoria de Jogos. Dois bandidos são presos por um crime grave, mas não há provas suficientes para condená-los à pena de 10 anos de prisão por esse crime, somente à penda de 1 ano, por porte ilegal de arma. Os investigadores gostariam de resolver o crime maior, por isso propõem a cada um dos bandidos, incomunicáveis entre si, um acordo: se testemunhar contra o outro na acusação mais grave, não será indiciado pelo porte ilegal.

A\BLealTraíra
Leal1\ 111\0
Traíra0\1110\10
Tabela de resultados entre prisioneiros A e B.


Se os dois se recusarem a trair seus parceiros, cada um vai preso por 1 ano. Quem trai o parceiro leal sai livre, enquanto o parceiro vai preso por 11 anos. Se os dois concordarem em trair um ao outro, cada um vai preso por 10 anos. Cada um, agindo de forma racional e egoísta, terá como estratégia dominante trair seu parceiro, pois, independente do que o outro faça, o resultado é melhor para si mesmo: 0<1

Cooperar para superar

Não havendo razão ou esperança de que as distribuições tomem essa iniciativa, resta a nós, usuários, alterar o equilíbrio do jogo. Se dermos preferência às distribuições comprometidamente Livres e ao hardware que funciona com elas, sinalizaremos tanto para as distribuições quanto para os fabricantes de hardware que o respeito ao usuário servirá aos próprios interesses deles.

Quanto mais gente fizer isso, maior será a preocupação dos fabricantes de hardware em respeitar seus clientes, pois isso aumentará suas vendas, e maior será a preocupação das distribuições em respeitar seus usuários, pois isso aumentará sua comunidade de colaboradores.

É óbvio que isso requer um baita esforço de educação e conscientização de todos. É também óbvio que, ao agirmos assim, de forma cooperativa, abriremos espaço para que alguns nos traiam e levem vantagem no processo, em detrimento de todos. Ainda assim, esse compromisso parece ser o que tem mais chances de levar a um resultado positivo: evitar a tragédia do bem comum.

Caso seus amigos traiam você e a comunidade, aceitando ou recomendando Software não-Livre, ou comprando hardware que o exija, não os traia de volta: explique por que é importante cooperarmos, não só para evitar a tragédia, mas para alcançar o respeito que merecemos enquanto humanos e usuários de software. Sugira aos amigos que adotem distribuições 100% Livres assim que possível e que, em sua próxima compra, procurem adquirir hardware que funcione adequadamente com elas. É através dessa cooperação que temos chance de alcançar o melhor resultado para todos.



G[e]nuíno pinguim religiosamente Livre,
de Guillaume Pasquet, baseado no tux original de Larry Ewing.


Referências

* Linux Libre
* Teoria dos Jogos
* Dilema do Prisioneiro
* Tragédia dos Comuns
* Free System Distribution Guidelines
* Free GNU/Linux Distributions

Copyright 2009 Alexandre Oliva

Cópia literal, distribuição e publicação da íntegra deste artigo são permitidas em qualquer meio, em todo o mundo, desde que sejam preservadas a nota de copyright, a URL oficial do documento e esta nota de permissão.

http://www.fsfla.org/svnwiki/blogs/lxo/pub/linux-libre


Publicado na edição #54, de maio de 2009, da [GNU/]Linux Magazine Brasil.

Texto retirado do site Dicas -l: http://www.dicas-l.com.br/dicas-l/20090705.php

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